quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Santo Agostinho

Agostinho, às duas horas da tarde, dirigiu-se ao portão para receber o correio que lhe pedia mais uma vez para assinar uma carta de que não precisava. Ao vergar os olhos apercebeu-se da vergonha, a carteira que tinha formas de jarra a florir entregava-lhe a carta do tribunal julgando-o provavelmente um pulha que engrandecia através de fugas amenas ao fisco, apertou as entranhas a disfarçar a barriga aumentada de uma gravidez de cinco meses, agradeceu timidamente e dirigiu-se para a porta maciça que lhe assegurava que os gatunos não o visitariam a altas horas quando ele, ajoelhado na lateral da cama, agradecia ao anjo da guarda a sua protecção em camisa de dormir. Ao abrir a carta de uma golpada, enfiou os olhos nas letras miudinhas e refez o susto ao averiguar uma penhora de bens móveis a executar o mais tardar quinta-feira. Deslumbrou-se com o valor avultado dos seus bens usados que nada valiam, pensando que talvez tivesse chegado a hora de refazer a decoração, um sofá sem um corpo desenhado a juntar a camas sem manchas de transportes e de uso. Dirigiu-se ao tribunal, transportou consigo a carta, ao encontrar o credor, arregaçou os dentes reluzentes

- O meu ouro está nos dentes

Depois da penhora, dirigiu-se à casa-de-banho, retirou os dentes de ouro, vendeu-os e dirigiu-se à imobiliária onde escolheu uma mobília cor de pinho porque ouviu comentar estar na moda.