Impingem-me o suplício anual de mijar num copo após a
delicadeza vampírica de me colocarem o sangue em frasquinhos que beberão através
de microscópios endiabrados que tomam a liberdade de realizar insinuações
acerca da minha saúde. Entrego-lhe as minhas veias, como um drogado aplicado,
endireita-me a mão e aperta-me o braço enquanto o azul se destaca. Desconhecia o
meu desprezo por agulhas: textura e temperatura deprimentes. A enfiarem-me objectos
nas veias pelo menos que me atirem o cérebro num orgasmo de anfetaminas. A saúde
é uma necessidade deprimente, hoje apetece-me um atropelamento e o corpo
rebentado, dias hospitalares, enfermeiras distraídas a tocarem-me nos órgãos onde não
gosto de ser tocado sem retribuição enquanto relatam episódios bocejantes
dos maridos gordos que enfardam cervejas e tremoços em halitoses futebolísticas.
Entro na casa de banho do outro lado do corredor pronto a enfiar o pénis no
copo, confronto-me com uma urina de um amarelo garrido que me deprime, atravesso
o corredor humilhado da falta de consumo adequado de água. Entrego o copo à
mulher da recepção, com o nome no recipiente a garantir que não haverá enganos, os
resultados dirão que a minha urina é amarela, a minha médica dir-me-á que
deverei consumir mais água e, como um tuberculoso, baixarei os meus olhos e
taparei a boca, na ânsia de não contagiar os meus próximos com a minha imprudência recente.